Abertura dos Partidos e eleições primárias – o contributo da Inovação Aberta

29-09-2014 14:42

 

A inovação aberta é um tema recente nos meios académicos e empresariais, que agrega e sintetiza um conjunto de práticas já existentes, mas que ganharam importância devido às alterações na economia mundial nas últimas décadas. Resumidamente, o que a inovação aberta nos diz é que as empresas devem olhar para o ambiente que as rodeia e identificar, selecionar e incorporar ideias, conhecimentos e tecnologias no seu processo produtivo, de forma a aumentar a sua capacidade de inovação. Do mesmo modo, as empresas devem valorizar no mercado as ideias e tecnologias desenvolvidas internamente (e que estão subaproveitadas) e com isso alargar o seu mercado ou mesmo penetrar em novos mercados. Ou seja, a empresa não inova de forma isolada, sendo fundamental a colaboração e articulação com entidades externas (outras empresas, universidades, intermediários tecnológicos, entidades públicas, etc.) mas também aproveitar as ideias dos seus recursos internos (trabalhadores) no processo de inovação.

O princípio da inovação aberta pode ser aplicado a outros níveis além das empresas. Por exemplo, na ciência (open science), na cultura (open culture) ou na informação pública e serviços públicos (open data; open government), como princípio de abertura, de inclusão e de transparência. Mas também pode ser aplicado numa área importante, embora não óbvia, como na política e nos processos eleitorais. É reconhecido que atualmente há um preocupante desligamento dos cidadãos face aos partidos políticos e à política em geral, como se pode constatar pelas taxas de abstenção em Portugal, que tem aumentado gradualmente a cada eleição, atingindo máximos históricos nas eleições Europeias de 2014 (66,2%), nas Autárquicas de 2013 (47,4%), nas Legislativas de 2011 (41,9%) e nas Presidenciais de 2011 (53,5%). Há também outros indicadores preocupantes, como o crescente descontentamento ou desconfiança dos cidadãos face à política e aos partidos.  

Face a isto, e face à perda de eleitores por parte dos tradicionalmente maiores partidos em Portugal, têm surgido iniciativas que visam abrir os partidos à sociedade civil, como o caso dos grupos de trabalho, de reflexão ou dos movimentos que visam recolher contributos de fora dos partidos tendo em vista a elaboração de programas eleitorais. Contudo, e embora sejam iniciativas meritórias, muitas vezes essas tentativas de abertura acabam por se fechar sobre si próprias, dado que a transformação das ideias e contributos de fora dos partidos em iniciativas concretas é um processo muitas vezes pouco transparente e com resultados pouco satisfatórios (por exemplo, devido à resistência no interior dos partidos a ideias vindas do exterior ou à limitação de recursos – humanos e financeiros - para a sua implementação). Pode-se dizer que é algo semelhante ao que se passa na inovação aberta, em que o termo “not invented here” é utilizado para descrever a resistência que existe dentro das empresas em adotar ideias e sugestões que tem origem fora da empresa. Em Portugal, os dados que existem mostram que a colaboração entre empresas e outras entidades está muito aquém do necessário para criar e sustentar dinâmicas de inovação, devido ao défice de competências, de estratégia e à falta de confiança que existe entre os vários agentes económicos (baixo nível de capital social).

Tal como nas empresas se mostra fundamental ultrapassar a resistência face ao exterior (por exemplo, via incentivos, facilitadores, etc.) também nos partidos terá de haver mecanismos de aproveitar de forma mais eficaz os contributos dos cidadãos anónimos e de outros atores da sociedade civil (think-tanks, centros de investigação..), de abrir as fronteiras dos partidos, tornando-os espaços de debate e de construções colaborativas, tornando-os mais inclusivos e próximos dos cidadãos. Será, sem dúvida, uma forma de enriquecer programaticamente os partidos e de responder mais proximamente às necessidades dos cidadãos.

Mas também é necessário incluir os eleitores anónimos nos processos de decisão dos partidos, que tradicionalmente estão vedados aos não-militantes. Isso acontece há algum tempo em alguns países, como nos Estados Unidos da América ou em Itália, em que os eleitores (militantes ou não) podem participar na escolha dos líderes dos partidos (eleições primárias). Recentemente esta prática foi introduzida em Portugal, e pelo Partido Socialista: pela primeira vez, qualquer eleitor pôde votar no candidato que achavam em melhores condições para poder concorrer a 1º Ministro. O sucesso deste mecanismo inovador de eleição é visível no número de eleitores não-militantes inscritos (mais de 150 mil), que em conjunto com os militantes do partido constituíram um universo de 250 mil eleitores. Destes, votaram cerca de 70% (ou seja, taxa de abstenção de apenas 30%), o que representa cerca de 6% dos 3,3 milhões de eleitores que votaram nas últimas eleições europeias em Portugal. Este é apenas um primeiro passo, que creio que será seguido em breve por outras forças políticas e aplicado a outros processos de decisão partidária. Afinal, quem decide as eleições (Legislativas, Autárquicas…) não são apenas os militantes dos partidos, mas todos os eleitores votantes.

Finalmente, tal como através da inovação aberta é possível às empresas aceder ou mesmo criar novos mercados, também uma maior abertura dos partidos permitir-lhes-á chegar a novos públicos, ou seja, cativar eleitores que tradicionalmente não votam nesse partido, os indecisos ou mesmo os desmotivados, que tradicionalmente se abstêm (e com as tecnologias da informação e comunicação este processo fica facilitado). Seguindo alguns dos princípios da inovação aberta, ganham os partidos, ganha a sociedade civil e ganha a democracia.